quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

O pacto - Parte 3



Na manhã seguinte, o sol estava forte e os pássaros cantavam alegremente sobre as árvores. Alannah acordou com a claridade no rosto e se assustou ao ver que Kenzie dormia ao seu lado. Observou-o um pouco; ele estava tão sereno... Era encantador.
Ouviu baterem à porta e foi atender. Era Stefan Paleeve.
- O senhor por aqui... A que lhe devo a honra da visita?
- Quero falar com meu filho – respondeu, de forma rústica. Alannah permaneceu imóvel. – Ande, não tenho o dia todo.
- Senhor, porque acha que ele está aqui?
- Por que o procurei por toda... Aliás, não é da sua conta, mocinha.
- Bem, eu sinto muito, mas ele não está aqui.
Ignorando a resposta, Stefan empurrou Alannah e entrou junto com seus dois capangas. Procurou por toda a casa, até finalmente chegar ao quarto onde Kenzie estava dormindo. Puxou-o pelos cabelos.
- O que está fazendo aqui, seu idiota? Sua noiva morre tragicamente e você vem passar a noite com uma outra qualquer?
Kenzie estava sonolento, não entendeu de imediato o que estava acontecendo e, em meio aos olhares do pai e de seus ajudantes, tentava compreender a situação. O pai deu-lhe um tapa no rosto.
- Responda-me! O que faz na casa dos Sovereignsun?
- Eu não sei, pai – respondeu, levando a mão ao local do tapa. – Mas não se atreva a chamar Alannah de outra qualquer mais uma vez, ela não é uma qualquer. Ela é o amor de minha vida, com quem sempre tive vontade de ficar ao lado para sempre.
Num súbito acesso de fúria, o pai começou a tapeá-lo e a gritar nomes terríveis; ele apenas tentava se defender. Alannah entrou no quarto e, ao ver o pai batendo nele, foi possuída por uma ira que quase não cabia dentro de si. Imediatamente se pôs a bater e arranhar o velho, e após levar alguns golpes e ser empurrada novamente, pulou sobre ele e agarrou suas costas. Começou a puxar seus poucos fios de cabelo, arrancando tufos e deixando em seus lugares buracos que logo começavam a sangrar.
Assustados, os capangas de Stefan se aproximaram para ajudá-lo, mas foram jogados para longe por uma força invisível. Bateram na parede e caíram desmaiados no chão.
 Alannah soltou o homem e ficou imóvel com o olhar fixo nele. Ele caiu no chão e tentou se arrastar para longe dela, mas não pode, pois suas pernas estavam presas, como se ali houvessem correntes que apertavam e imobilizavam-nas. Estava completamente aterrorizado, soltou um urro de dor. Implorou a ajuda do filho, que assistia à cena, horrorizado, mas não obteve resposta, apenas um olhar que se traduzia como “Depois de tudo, como tem coragem, pai?”.
Ela se abaixou e se aproximou de Stefan. Como uma cobra preparando-se para o bote, rodeou-o e olhou-o nos olhos por um tempo. Kenzie também se abaixou e se pôs na frente do pai, implorando que Alannah não o machucasse. Não era ela quem estava no controle de seu corpo, mas graças ao olhar angustiado de Kenzie, conseguiu tomar o controle, ficando atônita.
 Quando Sally chegou em casa, estranhou a porta aberta. Deixou a bolsa na porta e correu até o quarto de Alannah para verificar. Teve uma repulsa ao ver aqueles homens caídos ao chão, mas espantou-se mesmo com o fato de um deles ser o senhor Stefan Paleeve.
- Oh meu Deus, o que aconteceu aqui?
- Ele precisa de um atendimento agora!
- Está bem, está bem. Ajudem-me a levá-lo até lá fora.
Os três juntos carregaram o corpo até o coche e levaram-no até a casa do curandeiro da vila, Dante Tricky. Deitaram-no em uma cama.
- Ele foi atacado por...
Eles se entreolharam, por fim, Kenzie foi quem respondeu.
- Foi um urso. Não faço ideia de onde ele veio... Eu estava desarmado.
- Entendo. Os animais estão se aproximando bastante dos povoados. Bem, vocês terão que deixá-lo aqui para que eu possa fazer o ritual completo da cura. De manhã mando chamá-lo, senhor Paleeve.
- Mande também a conta. Ficarei muito grato, Dante.
Dante sorriu e eles saíram. Voltaram para a casa de Sally e acomodaram-se na sala de estar. Passaram alguns minutos em silêncio.
- Alannah, pode me explicar que diabos foi aquilo? – Kenzie perguntou, levantando-se.
- Eu, eu... Eu não... Eu não sei, Kenzie – ela começava a gaguejar, com terror nos olhos. – Era como se... Co-como se não fosse eu, entende? Não... Não era eu. Eu não seria capaz de fazer isso. Eu juro!
- Acredito em você – disse ele, com uma expressão facial duvidosa.
- Kenzie - continuou, levantando-se também -, olhe em meus olhos e diga: acha mesmo que eu seria capaz de fazer aquilo?
Ele permaneceu quieto e tia Sally interveio.
- Foi você, Alannah? Quero dizer...
- Tia Sally, foi meu corpo, foi algo dentro de mim. Eu nunca faria...
- E eu tentava me convencer de que isso não aconteceria.
- O que? – Perguntaram os dois ao mesmo tempo.
- Sentem-se, queridos, vou lhes contar uma história – eles obedeceram. – Há quarenta anos, nasceu uma garotinha chamada Dorothea. Era uma garota bela e meiga. Quando cresceu e se casou, após muitas tentativas e preces, descobriu que não podia ter filhos, e esse era o seu maior sonho, sua prioridade na vida. Num dia de manhã, um velho misterioso bateu à sua porta e lhe pediu que o encontrasse naquela mesma noite, em um galpão ali perto, pois tinha um assunto muito importante a tratar. Um assunto de grande interesse de sua parte. Sem conter a curiosidade, ela compareceu ao encontro, escondida do marido. O homem lhe disse que era um poderoso mago e que poderia ajudá-la a ter uma filha, e que em troca desejava apenas uma coisa: sua alma. Dorothea hesitou a princípio, mas sua vontade de ter uma filha era maior que tudo. Selou então o pacto, sem saber que o velho na verdade era Lúcifer. Passados os nove meses, a criança nasceu; era uma linda garotinha. No mesmo dia, seu marido faleceu de forma estranha. Aturdida, voltou à casa dos pais, os quais também vieram a falecer alguns dias depois. Dorothea, que sempre fora religiosa, foi à igreja procurar uma explicação para o que vinha acontecendo e descobriu que enquanto estivesse perto de sua filha, onde quer que fosse, quem as acolhesse morreria. Como a alma de Dorothea agora pertencia a Lúcifer, a filha havia sido amaldiçoada. Sua garotinha era a filha de Lúcifer. Foi então que Dorothea entregou a filha para uma cunhada, para amenizar o sofrimento da vida da garotinha. Mas nesse ponto, tudo o que apresentasse perigo ou sofrimento para a criança ou alguém próximo dela, seria extinto por suas próprias mãos, por mais que sua alma seja boa. Ela nunca pode e nem poderá viver entre pessoas falsas e com maldade no coração. – E terminou, lentamente: - E essa garota é você, Alannah.
Todos estremeceram ao ouvir a última frase, e, com terror, assistiram à tempestade que começava a cair do lado de fora da casa.


— thais de moura.

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